Bem-vindos!

Sejam bem-vindos! Este blog é uma tentativa de exercitar a insanidade de modo construtivo ou de destruir convenções via sanidade. Tanto faz. Caso você se pergunte sobre a minha seriedade aqui, explico com um trecho do Principia Discordia:

"- Você fala realmente sério, ou o quê?
- Algumas vezes eu trato o humor seriamente. Algumas vezes eu trato a seriedade humoristicamente. De qualquer forma, é irrelevante.
- Talvez você só seja maluco.
- Verdade! Mas não rejeite estes ensinamentos como falsos só porque eu sou maluco. A razão pela qual eu sou maluco é porque eles são verdadeiros."

Namastê!

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segunda-feira, 20 de junho de 2011

CIDADÃO KANE – Resenha crítica de um filme que você (erradamente) nunca pensou em ver


Já era hora de resgatar um clássico “ortodoxo”. Cidadão Kane (Citizen Kane, 1941) é dirigido e produzido por Orson Welles, que também faz o personagem principal. Foi um filme importante pra mim, na época em que certas decisões foram tomadas. E hoje, quando colho mais alguns bons frutos daquela decisão e o filme completa 70 anos, me deu vontade de comentá-lo e tentar convencer você a vê-lo.
Estranhou Cidadão Kane acompanhar A Camisinha Assassina, A Geladeira Diabólica e afins nesta seção do blog? Se as tosqueiras explícitas normalmente são negligenciadas por conta de sua “estranheza”, Cidadão Kane e outros grandes clássicos o são por sua antiguidade, ritmo mais “lento” de narrativa, ausência de cores fortes e grandes efeitos especiais etc. Em todos os casos, são filmes que a maioria das pessoas de hoje (erradamente) acaba não vendo. Todo mundo sabe que existem, mas quase ninguém vai lá conferir, como Shell Beach (Dark City, 1998) e a estrada abandonada que leva aos limites da realidade (13th Floor, 1999). Não sou aprioristicamente contra as modernidades hollywoodianas e a eventual diversão sem conteúdo. Só sugiro um equilíbrio via resgate das obras primas antigas, como Um Corpo que Cai (1958), Nosferatu (1922), Os Sete Samurais (1954)... E, como a substância última da realidade é o Tosco, tudo que dele deriva também o é, incluindo clássicos “ortodoxos” do cinema.
Bom, a obra prima da vez conta a história de um magnata da mídia, Charles Foster Kane, um menino pobre que enriquece e paga um preço por isso (na resenha de A Camisinha Assassina, eu não podia usar trocadilhos, mas agora posso). O filme começa pela morte de Kane, seguindo com a busca de um repórter pelo significado da última palavra do magnata no leito de morte: Rosebud. Aborda profundamente temas universais como poder, dinheiro, manipulação da opinião pública, solidão, felicidade, sensacionalismo, infância, que, portanto, guardam relação direta com sua vida, leitor(a) recém-chegado(a) de Velozes e Furiosos 5. É um daqueles filmes que pode ser interpretado sob incontáveis ângulos, edificantes em sua maioria. Um dos principais trata a distinção entre o que realmente traz felicidade e o que apenas ilude. Óbvio demais? Mas todos nós erramos feio nessas coisas e a grande maioria segue capengando até o final. Não estamos em condição de dispensar aprendizado, ainda mais pela arte, que consegue nos tocar com aquilo que, se apenas dito, seria banal.
O filme produziu diversos impactos no cinema, desde marcar a estréia de Orson Welles no gênero até novas técnicas de enquadramento e narrativa das quais alguns filmes que você glorifica são herdeiros. A obra foi um dos pilares daquele (mais ou menos) famoso documentário Muito Além do Cidadão Kane (1993), sobre a Rede Globo.
O filme de Welles foi feito para um público muito diferente do atual. As pessoas conseguiam fixar a atenção em um diálogo de vinte segundos sem se queixar que o filme é muito “parado”. As falas se desenrolavam articuladamente, com pausas naturais de respiração. Os cenários podiam ser admirados devagar. A trilha sonora conduzia o expectador como num sonho de domingo, quando não se tem pressa pra acordar. Já os filmes de hoje parecem não ter tempo pra si mesmos, como se alguém tivesse as calças em chamas.
Assim, filmes antigos como Cidadão Kane valem a pena por várias razões.  Eles quebram aquela nossa adrenalina habitual de ver filmes; dá até pra sentar. Frequentemente trazem ótimos enredos, até porque não havia recursos fáceis pra atrair o público, como explosões ou tecnologia 3D. Pode parecer estranho hoje, mas, antigamente, um filme precisava ter algo a dizer pra fazer sucesso. Partindo disso, vale lembrar que Cidadão Kane consta como o maior filme de todos os tempos em alguns rankings, como o da American Film Institute. Embora meu ranking seja um pouco diferente, alguma coisa tal classificação da AFI diz. Mesmo quando os enredos antigos parecem hoje “manjados”, é porque fizeram história e foram copiados à exaustão. Mas quem já subiu a serra sabe o quanto é bom beber da água do rio ainda na nascente...

sexta-feira, 20 de maio de 2011

A CAMISINHA ASSASSINA – Resenha crítica de um filme que você (erradamente) nunca pensou em ver

Se me contassem isso duas semanas atrás, eu chamaria o cara de lunático. Agora a idéia é perfeitamente plausível. Nos dias de hoje, nos deparamos com notícias sobre internet, ciberspace, radiação... Por que não uma camisinha assassina?"
Luigi Mackeroni

O físico e escritor alemão Georg Lichtenberg escreveu: “Há quem não ouça até que lhe cortem as orelhas”. “Ou coisa pior”, completaria Luigi Mackeroni, o heróico detetive de A Camisinha Assassina (Kondom des Grauens, Alemanha, 1996). Tenho escrito sobre os perigos dos objetos inanimados. Mas os leitores riem e me dão tapinhas nas costas, sem entender que às vezes trato o humor seriamente e às vezes trato a seriedade humoristicamente. Esta é uma carta preocupada aos amigos. Então, chega de trocadilhos. Cansei de ambiguidades. Se as epístolas anteriores não foram fundo o bastante, esta será mais dura e penetrante. Como lá no interior, é hora de prosa reta.

Tire as crianças da sala. A Camisinha Assassina é um filme adulto. Sem vergonha, ele mostra a verdade nua e por dentro: na guerra contra os objetos inanimados, ninguém pode tirar o seu da reta. Acalme-se, leitor(a) à mercê dos hormônios: não há sexo explícito no filme. Nas poucas cenas do tipo, o sexo não é mostrado, mas apenas insinuado. Entenda que é um suspense/terror, com pitadas humorísticas. Ou o contrário. De qualquer forma, é irrelevante. Parece que cruzaram Arquivo X e Emmanuelle (de novo, pois já existia Emmanuelle, Rainha da Galáxia)...

Estimulada pelos quadrinhos de Ralph Konig, a película de Martin Walz se alonga em um hotel nova-iorquino de quinta (e não na 5ª) chamado Quickie (a famosa “Rapidinha”). Em um quarto tão vazio quanto o avião de Plano 9 do Espaço Sideral, um professor machista é atacado, sob as vistas da aluna que queria uma nota mais alta. Ela só consegue um Lá sustenido de terror.

Na delegacia onde paradoxalmente jazia molenga, o policial linha-dura Mackeroni se levanta e penetra o mistério de quatro mutilações no Quickie. Como em A Geladeira Diabólica, seria um alerta sobre os perigos de objetos autolimpantes (e esse ainda se fecharia na embalagem). Porém, com uma mãozinha do garoto de programa Billy e do travesti Babette, Mackeroni descobrirá que o buraco é mais embaixo.
O policial e Billy logo se envolvem, mas, antes que o amor se consumasse, a camisinha salta (!) e ataca Mackeroni.

Ela não acerta exatamente o alvo, mas leva um pequeno souvenir, deixando a intimidade do policial parecida com o Gonzo sem o olho direito.



Esse eufemismo foi dureza... Enfim, só então Mackeroni engole o imbróglio da camisinha. Aí me meto a perguntar se Lichteberg foi vítima de um tapa-orelhas assassino... De qualquer forma, a verdade seria desnudada mais rápido no Quickie se o investigador fosse o Mulder.
Mackeroni fica muito bolado (curiosamente, desbolado também serve) e decide arregaçar as mangas. Enfiando uma mangueira de gás entre as pernas como isca, ele consegue capturar, inflar e explodir uma camisinha. A autópsia revela um híbrido humano-borracha, fruto de manipulação genética. De novo os cientistas malucos e suas maravilhas escatológicas. 
Os ataques se multiplicam como coelhos. São, portanto, várias camisinhas assassinas. Jornais mostram o furo sem pudor: “Dickless Dick”, senador Dick McGouvern é abocanhado. Prometi parar com os trocadilhos, mas esse aparece no filme... As investigações chegam ao nome do desaparecido doutor Boris Smirnoff, um especialista em genética animal e em derivados de borracha... Pausa pra admirar o currículo do simpático velhinho...
Você consegue construir uma idéia concisa com os temas calabouço, Croácia, hospital, polícia, camisinha, capela, faxina, pau, nariz? Konig consegue e uma faxineira croata sem nariz (por culpa da camisinha) leva a polícia a um calabouço dentro da capela do hospital e o pau quebra. Os protagonistas se reúnem lá, onde as intenções são reveladas, assim como o surpreendente destino de Smirnoff. À beira do Apocalipse, Mackeroni desperta como o Neo dos guetos, o Escolhido pela camisinha-mãe gigante, por ser superdotado. Evitando maiores spoilers, pois rogo a Dionísio que você veja o filme, apenas digo que o confronto final é épico. Épico. Se você admira a tosquice, será catapultado aos píncaros do prazer.
Como exemplo do que sempre falei sobre o tosco como caminho espiritual, A Camisinha Assassina tem mensagens edificantes nestes tempos em que a diversidade ainda convive com a intolerância. É um filme sobre liberdade religiosa e sexual, igualdade de direitos e a vida nas grandes cidades, em que a derrota final cabe aos moralistas neuróticos. Por fim, já não tão certa é a derrota dos objetos inanimados, contra os quais todo cuidado é pouco. Prova disso é a conspiração quase silenciosa que conseguiu deter o projeto para um  filme.  Pena que não veremos Nova York inteira falando alemão de novo...
Foram usadas 240 camisinhas autênticas e 500 réplicas. Realmente fiquei cansado ao me meter em algo dessa magnitude. Embora longa e grosseira, espero que minha escritura tenha ido direto ao ponto, e que você tenha gostado tanto quanto eu. Mais algumas palavras amáveis e vou dormir de exaustão. Só pegará mal se, depois de tanto esforço meu, você estiver rindo...

sexta-feira, 8 de abril de 2011

PLANO 9 DO ESPAÇO SIDERAL – Resenha crítica de um filme que você (erradamente) nunca pensou em ver

"Assisto Plano 9 toda vez que preciso me concentrar em um problema difícil (...). O filme é tão incrivelmente ruim e infantil que derruba os centros lógicos do meu cérebro, permitindo saltos intuitivos que seriam impossíveis de outro jeito".
Fox Mulder
(Arquivo X, 7ª temporada, episódio 19)

Voltei, cambada! Além do trabalho, sumi porque meu HD foi pro espaço. Falando nisso, vamos a uma resenha prometida faz tempo. Plano 9 do Espaço Sideral (Plan 9 From Outer Space, 1959) aparece em várias listas como o pior filme já feito (e talvez imaginado). E o pai da criança, Ed Wood, é frequentemente mencionado como o pior diretor de todos os tempos.

Penso ser ingenuidade encarar assim um dos meus filmes favoritos. Prefiro entender Plano 9 como a mais acurada coleção de profecias desde Edgar Cayce. E nisso o solene Criswell é claro já na primeira cena: Saudações, meus amigos. Todos nós temos interesse no futuro, pois lá é onde eu e você passaremos o resto de nossas vidas [eis a 1ª genial profecia; na época, não era um clichê]. E lembrem-se, meus amigos, que eventos futuros como estes irão afetá-los no futuro” [sic, juro... a 2ª profecia vem assim mesmo, na sequência e sem titubeio].  
O leitor fiel deve lembrar que uma das funções do blog é fomentar resistência ao apocalipse zumbi. E Ed Wood nos preparava pra esse evento desde muito. Passados mais de cinquenta anos do lançamento de Plano 9, podemos confirmar várias das profecias, o que me deixa confiante na exatidão das restantes (neste momento crítico, quem se importa com a “metáfora do peru cientista”??).
O filme trata de hostis alienígenas e discos voadores suspensos por barbantes tão visíveis quanto as raízes originais de cabelos pintados. Longe de uma precariedade nos efeitos especiais, o visionário diretor busca o artifício hipnótico do pêndulo. O som de liquidificador defeituoso emitido pelo disco fornece o chiado brando que completa o transe. É um jeito maquiavelicamente genial de nos manter sentados até o fim. Wood precisava garantir que receberíamos toda a mensagem.  
 Os alienígenas estão preocupados com o futuro desenvolvimento da bomba de... solaronite (sic, juro) pelos terráqueos “estúpidos, estúpidos!” (sic exaltado). Tal bomba “explodiria as partículas da luz solar” (sic), com uma indesejada reação em cadeia que destruiria nosso sol. Como se já não fosse grave, tal destruição se estenderia, como um “rastro de gasolina” (sic), até as demais estrelas. O efeito dominó aniquilaria, por consequência, todo o universo. Como é aterrador crescer e descobrir que minha ocasional raiva da humanidade (por maltratar animais etc.) era ingênua diante do que nossa espécie realmente pode fazer. Encontrei um prenúncio ainda mais terrível que o apocalipse zumbi: solaronite. É nossa 3ª profecia; não perca a conta.
Os extraterrestres tentam um contato amigável com nossos governantes, que, em resposta, apenas negam a existência dos discos voadores. Desconsolados, os visitantes decidem dominar a Terra. Pra isso, implementam o temível Plano 9, que se resume a... reviver os mortos. Eu não teria idéia mais coerente. Nem você. Tal genialidade simples e direta requer uma inteligência alienígena avançada pra concebê-la. Na vida real, o apocalipse zumbi será iniciado por extraterrestres? Os fungos que transformam formigas em zumbis (conforme noticiado aqui no blog) são alienígenas? Temo que seja essa a 4ª profecia.
Cavalheiresco, Wood deixa uma dama reviver primeiro. A “vampira” Maila Nurmi só é assim apresentada por conta do programa de TV que a fez famosa, “The Vampira Show”. Mas a ausência de caninos salientes e o caminhar pateticamente robótico e lento não deixam dúvidas: ela é uma zumbi clássica, prevendo George Romero (5ª profecia).



Já o segundo morto-vivo é um vampiro além de qualquer dúvida. Não bastassem o cabelo engomadinho e o centenário hábito de correr balançando a capa, ele é interpretado por ninguém menos que Bela Lugosi.
Mas ele faleceu em 1956, pouco depois de Wood tê-lo filmado sem ter idéia do Plano 9. Como Lugosi já era famoso antes no papel de vampiro, não sei se vê-lo como morto-vivo, três anos após sua morte real, foi redundância ou a 6ª profecia. Quero dizer, sei sim.
As demais aparições do vampiro são feitas com um dublê, o que explica seu rosto caricatamente escondido pela capa (com a qual – é razoável supor – um personagem idoso e convencional não seria enterrado. Mas um gênio indomado como Wood não imporia tais limitações à sua criatividade). Embora haja explicações simples, penso que o dublê era tão extraordinariamente parecido com Lugosi que seu rosto poderia assustar demais o público ainda em luto. E o rapaz se entregou apaixonadamente à tarefa de esconder a semelhança, deixando praticamente só o cabelo aparecer durante todo o filme. Haja dor no braço e amor pela arte.


Apenas mais um é revivido: o chefe de polícia. Décadas mais tarde, seu rosto se tornaria uma famosa máscara de halloween. Como a “vampira”, ele também se comporta como os zumbis que Romero tornaria clássicos. Reunir extraterrestres, zumbis e um vampiro no mesmo filme é muita ousadia. 



Aqui, uma escandalosa alusão ao apocalipse revelará nossa 7ª profecia. Pra quem pretendia criar um exército, os extraterrestres se contentaram com tão pouco? Mas a perspicácia é mesmo um dom e eles logo percebem a suficiente verdade: Lugosi, “vampira” e o policial seriam os 4 cavaleiros do apocalipse! Genial... Como diz aquele princípio universal do planejamento eficaz, seja entre terráqueos ou alienígenas, existem apenas 3 tipos de pessoas: as que sabem contar e as que não sabem.
Já Jeff Trent, o herói na história, é um piloto comercial cujos aviões se resumem a cubículos retangulares com duas cadeiras e uma cortina. Parece aquela música infantil sobre a casa muito engraçada que não tinha teto, não tinha nada. Assim, Wood concebeu as máquinas mentalmente controladas que só agora começam a surgir (8ª profecia e contando...). Aliás, a sala de reuniões dos extraterrestres tem decoração parecida (pouco mais que uma cadeira, uma mesa e a mesma cortina).

Nada mais previsível, já que eles são plenamente humanos, incluindo simpáticas barriguinhas de chopp alienígena (servido naquele bar maluco de Star Wars) e roupas da era da discoteca (9ª profecia). Aliás, nem os avanços tecnológicos de uma adiantada civilização espacial curarão a calvície (10ª).
Mas, diferente do avião que dispensa qualquer equipamento, o disco precisa de caixas metálicas com botões, ponteiros e fios tão familiares a nós. Portanto, em um misto de denúncia e profecia (a 11ª), o ousado Wood sugere que nosso desenvolvimento tecnológico, à época e no futuro, se basearia em ciência alienígena adquirida de discos voadores capturados pelo governo norte-americano. Não é à toa que Mulder é fã dele.  
 No mesmo embalo criativo, as lápides falsas caem ao sabor do vento. Imagino serem protótipos do cemitério da Barbie, que não fez tanto sucesso quanto a casa da Barbie, o carro, e por isso você nunca ouviu falar (mas você viu o tamanho das lápides na foto do pseudo-Lugosi. E a Barbie foi lançada justamente em 1959. Coincidência?). Filmagens diurnas e noturnas se alternam sem critério (um distúrbio temporal causado pelo campo magnético da nave?). Os diálogos são fascinantes. Filmes reais antigos do exército americano são usados e destoam das demais imagens em cor, textura... Aliás, tudo destoa de tudo, com cortes abruptos e uma narrativa tão fragmentada que parece psicótica.
Daí em diante é ladeira abaixo. Os mocinhos, liderados por Trent, lutam contra os mortos-vivos e finalmente chegam ao disco voador pousado no cemitério. Uma vez lá, Trent sai no braço com um dos extraterrestres, Eros (sic, juro). Na verdade, foi quase uma daquelas brigas de abraçar e puxar cabelo. Mas é reconfortante saber que o avanço tecnológico não extinguirá esse lado inofensivo da barbárie (12ª...). Na confusão, os equipamentos explodem e os mocinhos fogem. A nave incendiada decola e explode no céu. O tamanho das chamas revela uma descarada maquete de poucos centímetros de diâmetro. No solo, Trent e uns gatos pingados se perguntam se a ameaça acabou. O plano 9 não funcionou, mas nada sabemos sobre os terríveis 8, 7, 6... e sabe-se lá se 10, 11, 12...
O texto ficou grande. Mas a genialidade e a coragem de Wood não permitiriam menos. Na verdade, tive de me conter pra não escrever muito mais. De todo modo, os recados básicos foram dados. O apocalipse zumbi bate à nossa porta, por iniciativa extraterrestre. Os 4 cavaleiros do apocalipse virão de acompanhamento, junto com a salada. A calvície permanecerá sem cura. As brigas de puxar cabelo nunca acabarão. E ainda teremos de lidar com a solaronite no futuro, exatamente onde passaremos o resto de nossas vidas... pois acontecimentos futuros afetarão (precisamente) nosso futuro. Faço minhas as solenes palavras com que Criswell encerra o filme: “Meu amigo, você viu este incidente baseado em um testemunho jurado. Você pode provar que não aconteceu [eu acrescentaria: ou que não acontecerá]? Talvez em seu caminho de casa, você cruze com alguém na escuridão e nunca saberá se eles são do espaço sideral. Muitos cientistas acreditam que outro mundo está nos vendo neste momento. Nós rimos uma vez da carruagem sem cavalo, do avião, do telefone, da luz elétrica, das vitaminas, do rádio e até da televisão. E agora alguns de nós rimos do espaço sideral. Deus nos ajude... no futuro”.

domingo, 9 de janeiro de 2011

A CENTOPÉIA HUMANA – Resenha crítica de um filme que você (erradamente) nunca pensou em ver


Este já nasceu clássico. A centopéia humana (The human centipede, 2009) conta a história de um cirurgião aposentado, Dr. Joseph Heiter, que resolve usar sua perícia em separar irmãos siameses pra... criar pessoas siamesas. Ah, os gênios... Sem visionários como Heiter, não teríamos o pirocóptero, o sutiã que vira máscara de gás e os óculos com funil pra facilitar o colírio. Heiter pretende que três indivíduos sejam costurados uns aos outros, de modo a formar um único tubo digestivo.
Eu sei, gente... Defendo muito a pesquisa básica, mas isso também é demais. Assim, se você parar de ler aqui, nem ficarei magoado. Mas, na verdade, é meu tipo preferido de trash: tosco com a intenção de ser sério. A premissa consegue ser mais ridícula que em A Geladeira Diabólica, Dracula 3000 (já comentados no blog) e tantos outros. Já que a criação da centopéia se resume a pouco mais que costurar bocas em anus (eu sei... eca), o “novo organismo” sequer sobreviveria o suficiente pra recuperação pós-operatória. Aparece uma mensagem no trailer dizendo “100% medically accurate”. Sim... tanto quanto A Camisinha Assassina (resenha em breve).       
Como cientista convencionalmente cruel, Heiter inicia com experimentos em animais. Assim, ele cria uma centopéia canina com três hot vailers. E deu certo... Então, Heiter implementa o próximo e natural passo: humanos. Poucas vezes senti tanta “vergonha alheia” quanto ao ver os atores formando a centopéia, andando de quatro e com a cara grudada na bunda um do outro. A cena do despertar pretendia ser comovente: as vítimas chorando de terror e o cirurgião de alegria. Mas talvez chorassem por sua participação no filme. Depois das cenas de Heiter adestrando a centopéia no quintal, a Vanusa pode cantar como quiser e eu nem me importarei. Meu coração se petrificou.  
Heiter é o cientista maluco mais sortudo da história. Neste mundo enorme, as vítimas resolvem “amarrar o gato” nas moitas ao lado de onde ele aguarda. Sua casa fica no meio do nada e carros de turistas desavisados pifam injustificadamente quase no seu jardim. A última vítima, um japonês compreensivelmente desbocado, já aparece carregado e com um dardo tranquilizante no quadril. Acho que Heiter deixou o dardo sobre uma pedra e, enquanto preparava o rifle, a vítima sentou em cima. Mesmo com uma cara indisfarçável de psicopata (não que ele tentasse esconder) e dizendo logo de cara que odeia seres humanos, Lindsay e Jenny permanecem na casa do médico e aceitam beber a “água batizada” que as desmaiaria.
Mais uma prova de sua sorte sobrenatural: o porte do Heiter é pouca coisa melhor que o do Sr. Burns. Eu não seria tão otimista quanto à idade. No início, até achei ser um filme sobre zumbis ou vampiros. Assim, bastaria um soco, uma rasteira ou mesmo um susto tipo “bu!” pro velho cair morto e o filme acabar. Ainda assim, ele faz um imenso estrago, incluindo estar quase morto no chão e esfaquear o pescoço de um policial de pé, armado e 70 anos mais jovem. Há uma cena em que Lindsay recebe um tiro de tranquilizante pelas costas, se contorce e leva cinco minutos pra cair, revelando atrás de si Heiter ainda em posição de tiro. Estiloso? Não, é lentidão mesmo.
O filme é um desfile de clichês como raramente vi. Um cientista alemão maluco com voz de tumba, aquele sotaque clássico ao falar inglês e uma aparência que mistura Hitler e Mao Tsé-Tung, mulheres histéricas, emboscadas, becos sem saída, escadarias, maniqueísmo inflexível, rifles primariamente escondidos pelo sobretudo e todas as demais caricaturas, tudo à enésima potência. Mas há uma explicação. A idéia de uma centopéia humana demandou tanta energia criativa que não sobrou pro resto do enredo. E se a única criatividade do filme é uma implausibilidade completa, o que resta, então?
As atuações são tão sofríveis como em Mutantes – Caminhos do Coração. Ponto pro filme! Imaginar os testes de elenco me divertiu por dias. O enredo é cheio de escatologias. Em consideração à minha pizza de daqui a pouco, troco minha descrição pela imaginação de quem lê. A história segue arrastada, artificial, de modo que a mísera hora e meia de filme é levada a custo. Pensa que Tom Six, o diretor, ficou aliviado quando conseguiu acabar? No início, o título é acompanhado pelos dizeres “Primeira parte” (First sequence). Essa maravilha tem continuação, prevista pra 2011!! E Six promete mostrar uma centopéia formada por 12 pessoas!!! Eu sei, gente...
Eis o trailer. Como dizem, é só pra dar um gostinho na boca (Ops... Expressão infeliz pra ocasião):


quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

A GELADEIRA DIABÓLICA - Resenha crítica de um filme que você (erradamente) nunca pensou em ver

Retornemos aos clássicos.  A Geladeira Diabólica (The Refrigerator, 1991) conta a história de Steve e Eileen, um jovem casal que deseja iniciar a vida em Nova York.  Com alguma dificuldade, eles encontram um apartamento na periferia da cidade, no Brooklin, se bem me lembro. O aluguel é ótimo e o apartamento já vem com geladeira!

Mas o jovem casal não sabe que a vizinhança caricata será seu menor problema. Steve começa a experimentar estranhas mudanças psicológicas. Ele já era esquisito no começo do filme e progressivamente piora (ou melhora, na minha perspectiva). O apê possui um acobertado histórico de desaparecimentos. O dono não está disposto a falar a respeito, pois deseja apenas novos locatários. Primeira lição do filme: Pergunte sobre o histórico sobrenatural do apê que você pretende alugar. Sério.
Apenas algumas poucas pessoas sabem a verdade sobre o funesto lugar. Uma delas é Juan, o encanador. E aqui temos um dos pontos altos do filme, pois o papel é de ninguém menos que Freddie Mercury, oculto sob o pseudônimo Angel Caban. Juan e seu auxiliar Paolo passam a frequentar o apartamento, especialmente quando Steve não está. Assim começa a nascer uma conexão caliente entre Juan e Eileen.  Segunda lição do filme: Não subestime o efeito de um encanador bigodudo e semi-careca sobre sua esposa.
Enquanto Steve aos poucos enlouquece e se afasta de Eileen (e o esperto Juan se aproxima mais e mais), personagens secundários começam a desaparecer dentro do apê. Neste ponto, não há mistério pra nós, espectadores, pois o filme já começa com uma tórrida cena de sexo no chão da cozinha, interrompida por um ataque mortal da geladeira. Terceira lição: Sexo selvagem no chão pode ser inesquecível, mas pode custar sua vida. Cabe avaliar a relação custo-benefício.   
A geladeira domina psicologicamente os personagens e talvez mesmo os atores. A loucura de Steve é fomentada por sonhos e alucinações. Em uma das mais bizarras, seu ditatorial chefe faz um emocionado e profundo discurso, miniaturizado, entre as prateleiras da geladeira. As atuações são um capítulo a parte. A dramaticidade é indescritível.
As cenas de morte dos personagens secundários também salvam, por si, o filme. Paolo é mastigado pela geladeira, que usa a porta como mandíbula. A mãe de Eileen é engolida inteira mesmo. E a geladeira é autolimpante, pois o sangue que jorra abundantemente no chão, janelas e na geladeira em si não está mais lá quando os personagens centrais retornam à cena. Quarta lição: Desconfie dos eletrodomésticos autolimpantes. A satânica e constante luz vermelha do interior da geladeira leva à quinta lição: Se sua geladeira parece um bordel antigo, livre-se dela.
Atormentada, Eileen busca respostas, ajudada pelo incansável Juan. Sexta lição: Meninas, desconfiem daqueles “amigos” solícitos demais. Vocês sabem o que eles querem, né? Querem apenas sobreviver ao ataque final das forças sobrenaturais, neste filme trash que é nossa vida... Assim, Eileen e Juan procuram a enigmática cigana Tania, que os roteiristas tiveram a coragem de fazer morar em uma tenda esotérica no meio de uma paisagem gótica. E você achando que a vizinhança era o grande clichê do filme.
Perguntada sobre o mistério, Tania sentencia para Eileen: “Sua geladeira é um portal para o inferno”. Por mim, o filme acabaria aqui. Sério. Seria uma deixa perfeita para o segundo filme, em que Eileen e Juan formariam um exército sobrenatural “do bem” para o derradeiro confronto contra a geladeira. A batalha de Minas Tirith, em “O Retorno do Rei”, ficaria no chinelo. Mas o pessoal decidiu liquidar a fatura num único filme. Falta de tino comercial.
Resumindo a ópera de sangue, Steve é finalmente liquidado pela geladeira. Suas últimas palavras a Eileen são lapidares: “Nade, minha peixinha. Nade para bem longe daqui...” Alguém ainda dirá o mesmo a Iara, a sereia de “Mutantes – Caminhos do Coração”.
O confronto final com a geladeira é épico. Épico. Juan, Eileen, Tania e um ilustre desconhecido invadem o apartamento.  O desconhecido está lá apenas pra morrer rápido. Sétima lição: Cachorro que entra na igreja apenas porque a porta está aberta pode ser alvo da fúria sobrenatural. Oitava lição: Antes de filar bóia no apê do seu vizinho, pergunte se aquela agitação toda é mesmo uma festa.  Juan mostra seus dotes de toureiro/cowboy/tanto-faz e laça a selvagem geladeira. Mas o Mal ainda não foi vencido, como decreta Tania: “Nossos corações batem e nossos pulmões respiram em silêncio. Restam espasmos de esperança e fé em alguma coisa. Mas, se nós olharmos aqui, agora, apenas morte é o que existe e ela não se satisfez”. Bonito demais. Eu me arrepio.  
Imobilizada, a geladeira convoca um ataque de eletrodomésticos assassinos voadores e rastejantes. Nona lição, tirada da morte do desconhecido: Em hipótese, barbeadores elétricos podem produzir o mesmo estrago.  Vejam por si mesmos, pois achei a cena no Youtube. Mas é só pra dar um gostinho. Tentem assistir ao filme completo.  
No fim, restam vivos apenas Eileen e Juan, que se tornam dançarinos profissionais de flamenco. Sério. O apê é disponibilizado para locação novamente, com a tentadora geladeira incluída. A cena final resume o filme: uma cusparada nojenta pela janela, bem na cara de quem passa. É uma clara alusão a nós, espectadores. Pra fechar, a décima lição: Não leve a vida tão a sério, porque, no fim, todo mundo dança.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

DRACULA 3000 - Resenha crítica de um filme que você (erradamente) nunca pensou em ver

Inauguro a categoria de resenhas críticas de filmes com um de meus favoritos, o pouco aclamado Dracula 3000. Não se trata do consagrado Dracula, de Bram Stoker, e tampouco daquele Dracula 2000, que já poucos se arriscaram a ver. Como o nome sugere, a história não á ambientada em séculos passados ou na contemporaneidade, mas sim no distante ano 3000... no espaço sideral... (Eu sei. Wow.)
Naquele fictício ano 3000, a humanidade já se tornou uma espécie cósmica, espalhando-se como "uma videira entre os mundos", lembrando Carl Sagan. Nosso hábito de espalhar lixo alcançou outras orbes, de modo que aventureiros vasculham o espaço em busca de algum playstation 3 ainda funcional. É assim que a espaçonave chefiada por Van Helsing (!) encontra outra bem maior e aparentemente à deriva. Ao entrarem, Van Helsing e sua trupe descobrem caixões recheados de um estranho pó ou areia. Quando um inesperado acidente (eu não esperaria... e você?) faz cair uma gota de sangue dentro de um dos caixões, Dracula se recompõe e começa a matança. E assim vai até o final. Mas não se deixe enganar pelo humilde sarcasmo desta resenha: o filme não é (oficialmente) uma comédia.

Para não me alongar demais (em consideração a você, caro leitor, que precisa trabalhar), a nave de resgate é composta pelo tatatatataraneto do conhecido Van Helsing (!!), uma loira pin-up, um fortão, um gênio da ciência que se arrasta em uma cadeira de rodas comum e enferrujada (no ano 3000...), um mano com sotaque carregado do Bronx (no ano 3000...) e mais alguém que eu esqueci e que não faz diferença, porque morreu logo. Aprenda com tantos filmes que esse é o time ideal para qualquer confronto com o sobrenatural... desde que você seja o(a) chefe ou o par romântico dele(a), porque o resto morre.
Agora, tente reconstruir mentalmente o cenário. Uma enorme e  moderna nave do ano 3000, construida pra explorar a imensidão cósmica, capaz de viajar anos-luz com tripulação, mas é feita de parafusos, canos e escadas meio enferrujados, escotilhas, roldanas e fios pendurados (familiares a quem já viu uma fábrica dos anos 80). A nave ainda possui video cassete (não é DVD, nem Blu-ray... é cassete mesmo), TV com antena externa e tubo de imagem, e filtro de água desses de galão azul transparente. Só faltou o frigobar. Tudo isso aparece no filme, bem nos cantos do cenário, além da percepção dos desatentos.  Essa aberração anacrônica espacial transporta o vampiro Dracula, do planeta Transilvânia (!!!). Ao acordar, Dracula quer voltar para a Terra (!!!!) e estender seu banho de sangue ao nosso planeta que, a pensar pela coerência do enredo futurista, ainda deve ter Justin Bieber no topo. Embora seja um futuro em que a religião foi extinta e um crucifixo tão familiar a nós não é reconhecido, os aventureiros se referem ao demônio várias vezes. Mas, substituindo o sarcasmo pela empatia, eu também diria o mesmo diante de um vampiro que corre pela nave com roupas do século XIX e balançando a capa.
Possivelmente esqueci coisas importantes, enquanto subestimei algumas e superestimei outras. Talvez eu tenha inventado parte ou mesmo tudo. Mas lembre-se, leitor tão crítico, que entrei em transe nos primeiros minutos do filme, quando vi que as luzes de um dos corredores da nave eram alimentadas por uma bateria comum bem no canto da cena. Assim, meu testemunho não é confiável.
Apesar disso, como uma mensagem de alento a você que está mergulhado nas pressões e incertezas cotidianas, recomendo que dedique duas horas a Dracula 3000. É um filme que traz, ao final, uma reconfortante sensação de segurança. Não importa quanta besteira você faça no trabalho, em casa ou mesmo com o planeta. Não importa seu relatório atrasado, a bronca do chefe, a greve de sexo do(a) parceiro(a), a tensão entre as Coréias. Algumas coisas ainda estarão lá... incluindo explosões no espaço com muito fogo.
Aos descrentes, o trailer: