Bem-vindos!

Sejam bem-vindos! Este blog é uma tentativa de exercitar a insanidade de modo construtivo ou de destruir convenções via sanidade. Tanto faz. Caso você se pergunte sobre a minha seriedade aqui, explico com um trecho do Principia Discordia:

"- Você fala realmente sério, ou o quê?
- Algumas vezes eu trato o humor seriamente. Algumas vezes eu trato a seriedade humoristicamente. De qualquer forma, é irrelevante.
- Talvez você só seja maluco.
- Verdade! Mas não rejeite estes ensinamentos como falsos só porque eu sou maluco. A razão pela qual eu sou maluco é porque eles são verdadeiros."

Namastê!

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Lá e de volta outra vez: The Big Bang Theory entre a ciência e o estereótipo


A 4ª temporada de TBBT acabou. Enquanto aguardo a 5ª, penso na magia que o fim de um ciclo desperta: a revisão crítica.
A 1ª temporada me surpreendeu positivamente. Embora lotada de caricaturas, como nerds socialmente inaptos e a vizinha gostosa/inculta, a série tinha um diferencial que valia a pena: muitas piadas eram sobre ciência ou tinham nela um componente vital. Sheldon fantasiado de Efeito Doppler é um exemplo clássico. Como se isso já não fosse ótimo, tantas outras piadas tinham em ícones nerd (filmes, séries, jogos, livros clássicos...) semelhante alicerce. A cena do RPG online em que o Sheldon rouba e vende a espada pro Howard no eBay é fantástica. Não tinha como eu não gostar.
Então vieram a 2ª e 3ª temporadas, quando a série alcançou maior sucesso e os ditames da audiência me pareceram pesar. As piadas então se concentraram exclusivamente nas esquisitices dos personagens, em detrimento dos ícones nerd e, principalmente, da ciência. A cada cena, os personagens pareciam jogar tortas na própria cara e gritar: “Olhe como sou esquisito! E olhe como isso é engraçado!” Como principal exemplo, as características da síndrome de Asperger cristalinamente presentes em Sheldon fizeram dele o personagem mais popular. A coisa virou uma espécie de “Friends nerd”, com direito ao retorno de Rachel e Ross (Penny e Leonard). Haja estereótipos. Não digo que não ri em tais temporadas ou que as piadas com conteúdo da 1ª não se nutriam também das esquisitices. Mas algo importante havia se perdido.
Alguns argumentaram que as piadas “científicas” e nerdísticas (adoro neologismos) eram inacessíveis ao grande público, e que a série agora havia se tornado mais inteligível. Se Sheldon ouvisse, ele provavelmente rebateria, acusando uma falácia da falsa dicotomia. Isso porque uma forma de piada não exclui a outra, como a 1ª temporada confirmou. Os primeiros roteiros também mostraram que o não-entendimento da piada “hermética” era em si uma (ótima e interativa) piada, como quando (não canso de lembrar) ninguém entendia a fantasia de Efeito Doppler do Sheldon, mesmo quando ele explicava. Além disso, pensando em uma TV mais útil, quão legal seria se clássicos da literatura, teorias científicas, biografias de grandes pensadores etc. fossem cada vez mais mostrados como interessantes, ao invés de menos...
Foi quando os deuses nérdicos (Arthur C. Clarke, Carl Sagan, Allan Poe...) ouviram minhas preces e as piadas sobre ciência e afins voltaram na 4ª temporada. Só pra exemplificar, aquele episódio das fofocas enquanto memes foi dos melhores. Também foi extraordinária a metralhadora de piadas científicas que o Sheldon bêbado se tornou em seu discurso de premiação.  E assim, TBBT foi como Bilbo Bolseiro, “lá e de volta outra vez”, das piadas verdadeiramente nerdísticas  a elas novamente. Agora posso dizer que aguardo ansioso a 5ª temporada.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

A CAMISINHA ASSASSINA – Resenha crítica de um filme que você (erradamente) nunca pensou em ver

Se me contassem isso duas semanas atrás, eu chamaria o cara de lunático. Agora a idéia é perfeitamente plausível. Nos dias de hoje, nos deparamos com notícias sobre internet, ciberspace, radiação... Por que não uma camisinha assassina?"
Luigi Mackeroni

O físico e escritor alemão Georg Lichtenberg escreveu: “Há quem não ouça até que lhe cortem as orelhas”. “Ou coisa pior”, completaria Luigi Mackeroni, o heróico detetive de A Camisinha Assassina (Kondom des Grauens, Alemanha, 1996). Tenho escrito sobre os perigos dos objetos inanimados. Mas os leitores riem e me dão tapinhas nas costas, sem entender que às vezes trato o humor seriamente e às vezes trato a seriedade humoristicamente. Esta é uma carta preocupada aos amigos. Então, chega de trocadilhos. Cansei de ambiguidades. Se as epístolas anteriores não foram fundo o bastante, esta será mais dura e penetrante. Como lá no interior, é hora de prosa reta.

Tire as crianças da sala. A Camisinha Assassina é um filme adulto. Sem vergonha, ele mostra a verdade nua e por dentro: na guerra contra os objetos inanimados, ninguém pode tirar o seu da reta. Acalme-se, leitor(a) à mercê dos hormônios: não há sexo explícito no filme. Nas poucas cenas do tipo, o sexo não é mostrado, mas apenas insinuado. Entenda que é um suspense/terror, com pitadas humorísticas. Ou o contrário. De qualquer forma, é irrelevante. Parece que cruzaram Arquivo X e Emmanuelle (de novo, pois já existia Emmanuelle, Rainha da Galáxia)...

Estimulada pelos quadrinhos de Ralph Konig, a película de Martin Walz se alonga em um hotel nova-iorquino de quinta (e não na 5ª) chamado Quickie (a famosa “Rapidinha”). Em um quarto tão vazio quanto o avião de Plano 9 do Espaço Sideral, um professor machista é atacado, sob as vistas da aluna que queria uma nota mais alta. Ela só consegue um Lá sustenido de terror.

Na delegacia onde paradoxalmente jazia molenga, o policial linha-dura Mackeroni se levanta e penetra o mistério de quatro mutilações no Quickie. Como em A Geladeira Diabólica, seria um alerta sobre os perigos de objetos autolimpantes (e esse ainda se fecharia na embalagem). Porém, com uma mãozinha do garoto de programa Billy e do travesti Babette, Mackeroni descobrirá que o buraco é mais embaixo.
O policial e Billy logo se envolvem, mas, antes que o amor se consumasse, a camisinha salta (!) e ataca Mackeroni.

Ela não acerta exatamente o alvo, mas leva um pequeno souvenir, deixando a intimidade do policial parecida com o Gonzo sem o olho direito.



Esse eufemismo foi dureza... Enfim, só então Mackeroni engole o imbróglio da camisinha. Aí me meto a perguntar se Lichteberg foi vítima de um tapa-orelhas assassino... De qualquer forma, a verdade seria desnudada mais rápido no Quickie se o investigador fosse o Mulder.
Mackeroni fica muito bolado (curiosamente, desbolado também serve) e decide arregaçar as mangas. Enfiando uma mangueira de gás entre as pernas como isca, ele consegue capturar, inflar e explodir uma camisinha. A autópsia revela um híbrido humano-borracha, fruto de manipulação genética. De novo os cientistas malucos e suas maravilhas escatológicas. 
Os ataques se multiplicam como coelhos. São, portanto, várias camisinhas assassinas. Jornais mostram o furo sem pudor: “Dickless Dick”, senador Dick McGouvern é abocanhado. Prometi parar com os trocadilhos, mas esse aparece no filme... As investigações chegam ao nome do desaparecido doutor Boris Smirnoff, um especialista em genética animal e em derivados de borracha... Pausa pra admirar o currículo do simpático velhinho...
Você consegue construir uma idéia concisa com os temas calabouço, Croácia, hospital, polícia, camisinha, capela, faxina, pau, nariz? Konig consegue e uma faxineira croata sem nariz (por culpa da camisinha) leva a polícia a um calabouço dentro da capela do hospital e o pau quebra. Os protagonistas se reúnem lá, onde as intenções são reveladas, assim como o surpreendente destino de Smirnoff. À beira do Apocalipse, Mackeroni desperta como o Neo dos guetos, o Escolhido pela camisinha-mãe gigante, por ser superdotado. Evitando maiores spoilers, pois rogo a Dionísio que você veja o filme, apenas digo que o confronto final é épico. Épico. Se você admira a tosquice, será catapultado aos píncaros do prazer.
Como exemplo do que sempre falei sobre o tosco como caminho espiritual, A Camisinha Assassina tem mensagens edificantes nestes tempos em que a diversidade ainda convive com a intolerância. É um filme sobre liberdade religiosa e sexual, igualdade de direitos e a vida nas grandes cidades, em que a derrota final cabe aos moralistas neuróticos. Por fim, já não tão certa é a derrota dos objetos inanimados, contra os quais todo cuidado é pouco. Prova disso é a conspiração quase silenciosa que conseguiu deter o projeto para um  filme.  Pena que não veremos Nova York inteira falando alemão de novo...
Foram usadas 240 camisinhas autênticas e 500 réplicas. Realmente fiquei cansado ao me meter em algo dessa magnitude. Embora longa e grosseira, espero que minha escritura tenha ido direto ao ponto, e que você tenha gostado tanto quanto eu. Mais algumas palavras amáveis e vou dormir de exaustão. Só pegará mal se, depois de tanto esforço meu, você estiver rindo...